sexta-feira, 27 de março de 2009

Entrevista à Associação Portugal-Sérvia

O JornalismoPortoNet, o ciberjornal do curso de Ciências da Comunicação da Universidade do Porto, entrevistou o presidente da Associação Portugal-Sérvia a propósito do décimo aniversário do início do ataque da OTAN à Jugoslávia, que abaixo se publica, não deixando de agradecer a Ana Maria Henriques o interesse pela Sérvia e o contacto com a APS.

1. Como é que se viveu, em 1999, os bombardeamentos da NATO sobre a Sérvia?

Antes do mais com uma grande dose de informação errada e servindo os propósitos dos agressores: nós! Desde o final da Segunda Grande Guerra que não se assistira ao bombardeamento de populações civis – e inocentes – no coração de um Estado europeu. A guerra de agressão, ao arrepio de todas as leis internacionais, levada a cabo pela OTAN contra um Estado soberano foi um acto de uma gravidade, e barbárie, que vêm sendo escamoteada até hoje. Como sempre impera a lógica dos vencedores, a demonização do vencido e o branqueamento da verdade, algo que infelizmente vai sendo cada vez mais comum nos nossos dias. Por cá, como sempre, inventou-se um demónio de circunstância, reescreveu-se a história e omitiu-se ao povo as razões pelas quais Portugal atacava um Estado europeu na defesa de interesses impossíveis de justificar e que seguramente não eram os nossos...

2. Qual o impacto desses bombardeamentos na vida da Sérvia e do próprio Kosovo?

Gostaria de recordar que, estive em Belgrado exactamente um ano antes do ataque e que, mesmo estando distante, me chocou profundamente a guerra. Foi com consternação que recebi a notícia da morte de uma amiga (civil evidentemente), que vi as imagens do Hotel onde me tinha hospedado literalmente destruído e aquela bela cidade profundamente marcada por um ataque selvagem. Foram dias terríveis os vividos pela população local. Dias de terror, de medo e sobretudo de incompreensão pelo que se tinha abatido sobre eles.
Nas muitas mentiras divulgadas no Ocidente referiam-se sobretudo os alvos militares. É mais uma das grandes mentiras daquela guerra que destruiu alvos indiscriminados e matou, sobretudo, civis inocentes. A pax americana não perdoa e a Jugoslávia tinha que desaparecer. A velha escola de Catão ressuscitava na Europa, pela mão americana, em pleno século XX. A antiga Sérvia era vergada pela força e obrigada à submissão por uma coligação de agressores.

O Kosovo como verdadeira colónia américo-albanesa na Europa foi a principal vítima. Arrancado da pátria-mãe, lançado no terrorismo muçulmano patrocinado (estranhamente?) pelos EUA, transformou-se no maior problema da Europa, da sua segurança e estabilidade, dez anos depois. Um “bom” balanço...

3. Dez anos depois, quais as diferenças que se verificam na Sérvia e no Kosovo?

Ainda hoje persistem marcas muito profundas da agressão. Marcas de difícil superação. Famílias que consideram esta ocupação mesmo pior do que a dos Nazis, quando da Segunda Guerra, o que acho diz muito sobre a exemplar “construção da democracia” nos Balcãs e sobre o desmembramento da ex-Jugoslávia. Embora subsista na Sérvia o desejo de integração na União Europeia, a política criminosa relativamente ao Kosovo condiciona muito, a nosso ver, a evolução política do território.